Introdução
Escrever um texto acadêmico – ou seja, um artigo científico, tese de doutorado, dissertação de mestrado, monografia, trabalho de final de curso ou mesmo um trabalho de disciplina de faculdade – é uma tarefa que implica determinadas posturas do autor. Dentre as várias responsabilidades, seja quanto à qualidade da pesquisa, ao estilo da escrita ou ao uso do léxico (os termos e palavras empregadas), uma delas diz respeito à conduta do autor perante suas fontes. Com tanta facilidade de acesso à diferentes informações torna-se cada vez mais fácil perder de vista a origem das informações e uma das consequências pode ser a cópia, o plágio, ainda que de maneira não intencional.
Mas afinal, o que é que se espera de um trabalho acadêmico e o que se deve fazer para evitar o plágio? Essa é uma pergunta que pretendo discutir a seguir, na qualidade de professor universitário e doutor em design, nesse post que será um pouco mais longo que os demais. Um dos motivos para esta postagem longa é justamente tentar apresentar o texto seguindo alguns dos preceitos que caracterizam o texto acadêmico.
Antes de começar, vale comentar que apesar de alguma autoridade garantida por minha atividade profissional e título a argumentação que apresento não é e nem pode ser fundamentada apenas por minha opinião pessoal. Normalmente, quando se escreve um texto acadêmico alguma das qualidades almejadas são, conforme o professor Silvio Chibeni (s/d, p.1) argumenta são a objetividade e a clareza. Mesmo ao se tratar de pesquisas qualitativas (que privilegiam dados pouco quantificáveis, como a etnografia, estudo de caso etc.) a validade, objetividade e confiabilidade são critérios importantes (Flick: 2009 p. 352). Para alcançar tais critérios, são empregadas estratégias de maneira a se evitar a manifestação de um ponto de vista apenas pessoal e opinativo. Assim, para que o argumento ganhe fundamentação, é comum se recorrer a diferentes fontes – sejam bibliográficas ou não, tais como entrevistas, observação de campo, experimentos etc – de maneira a evidenciar informações que sustentem as afirmações.
Características do texto acadêmico (desenvolvimento)
Para entender o que se espera de um texto acadêmico, é interessante conhecer suas características. Diversos textos acadêmicos, em especial aqueles mencionados no primeiro parágrafo, são de natureza dissertativa (embora haja outros tipos como resumos, resenhas, fichamentos). Segundo Medeiros (2004, p.260), isso significa apresentar um “juízo valorativo sobre um fato, ou acontecimento” sendo composto por “introdução, desenvolvimento e conclusão”. Em outras palavras, um texto que apresente uma construção a partir das informações coletadas. Nas palavras de Medeiros:
Para Siqueira (1995, p.11), se não houver a participação pessoal no texto, com a elaboração de um ponto de vista, “o texto produzido não será texto e sim um pseudotexto, pois apresentará simplesmente a informação que já faz parte do saber partilhado, do conhecimento de todos”. (Siqueira apud Medeiros: 2004, p. 260)
Conforme mostram Siqueira e Medeiros, não basta reunir uma série de informações e apresentá-las (a menos que se trate de um fichamento ou resumo). Quando se trata de um texto dissertativo, espera-se que haja uma articulação entre as informações em favor de uma opinião que se sustente mediante uma argumentação que seja válida, objetiva e confiável.
Outra qualidade que se espera de um texto acadêmico diz respeito à sua originalidade. Mas se é imperativo que se fundamente a opinião em outros dados, como seria possível estabelecer um trabalho original? Medeiros (2004 p.56) fala da ilusão de originalidade que ocorre pelo fato de empregar as referências na construção de textos. Ainda que apoiado em outras teorias e opiniões e mesmo que não haja um caráter inédito no texto, a originalidade se encontra muitas vezes na maneira como o texto é construído.
O problema do plágio (desenvolvimento)
A questão da originalidade tem sido muito debatida por diferentes estudiosos, alguns creem ser simplesmente impossível criar algo completamente inédito, uma vez que há sempre a fundamentação em outros autores e ideias. Todavia é praticamente um consenso entre os acadêmicos em se rejeitar a cópia pura e simples de informações. A “cópia indevida”, ou seja, o plágio, é visto com maus olhos por universidades e instituições de ensino e pesquisa, que tem se manifestado abertamente para combatê-lo.
Na era da internet o plágio tem se tornado fonte de preocupação para as universidades tanto pelas dificuldades de identificação, como também pelas implicações éticas, morais e legais cabíveis e aplicáveis. Uma das formas de tentar prevenir a cópia é a informação sobre o que é considerado lícito e ilícito, ou seja o que é de fato uma referência bibliográfica e o que é plágio. Outras formas envolvem sanções e punições na academia, podendo resultar na reprovação ou mesmo expulsão do responsável, como também âmbito da lei tanto nas esferas civil como penal (PUC-Rio, s/d).
Engana-se, por exemplo, quem acha que o plágio é apenas o texto reproduzido com as mesmas palavras por outra pessoa. Conforme apresentado em documentos desenvolvidos pela UFF/IACS e pela PUC-Rio o plágio pode ser integral, parcial ou conceitual. Isso significa que plágio pode ser, respectivamente: a cópia do trabalho inteiro sem a correta atribuição da fonte; uma montagem de fragmentos sem menção ou mesmo a cópia da essência da obra; ainda que uma forma distinta.
Uma dificuldade que identifico contribuir para o aumento de casos de plágio diz respeito aos hábitos de apropriação presentes no meio digital. A facilidade da cópia com apenas dois comandos tem levado à reprodução de textos, imagens e outros tipos de conteúdos em websites, blogs, chats e redes sociais de maneira inescrupulosa. Apesar de muitos casos ferirem os direitos autorais de autores, é possível relevar alguns que visam a retransmissão e divulgação de informações, especialmente de maneira ligada as esferas pessoais e informal. A dificuldade, entretanto, reside na transposição destas práticas para os trabalhos acadêmicos.
Estratégias para se evitar o plágio (desenvolvimento)
O problema em relação ao texto acadêmico é que, conforme exposto anteriormente, pressupõe-se validade, confiabilidade e objetividade, mas também espera-se originalidade. Com isso a escrita acadêmica dissertativa apresenta uma forma típica em que se assume que o texto como um todo é original e inédito (apesar da discussão sobre os limites da novidade). Salvo quando explicitamente evidenciado mediante marcações de paráfrase (citação palavra a palavra) ou citações indiretas (menção a ideias e conceitos), assume-se que todo o restante do texto foi escrito pelo autor.
Com isso, mesmo a mudança de determinadas palavras ou o emprego de mais de uma fonte de consulta não bastam para configurar um novo texto: é preciso haver uma construção autoral. O caso fica ainda mais grave quando aparecem trechos ou textos inteiros reproduzidos sem a devida atribuição em trabalhos de natureza acadêmica. Ainda que as fontes de consulta constem nas referências, o esperado é que tenham servido como consulta e não como trechos reproduzidos.
Portanto, para se evitar o plágio é preciso um cuidado de atribuição das ideias e fontes de pesquisa. O texto dissertativo é frequentemente apresentado mediante uma espécie de “mapeamento” das referências no qual toda vez que se trata de uma frase ou ideia de outra pessoa ela deve estar referenciada. Isso deve ocorrer tanto no trecho em que ocorre como também ser resgatada posteriormente nas referências bibliográficas.
Como exemplo no presente texto, alguns artifícios foram empregados para ressaltar palavras e ideias de outras pessoas. O uso de itálicos, por exemplo, destaca termos fora da língua ou conceitos utilizados por autores. O uso de aspas, por sua vez, pode indicar tanto figuras de linguagem e expressões como também as palavras como foram empregadas no original, conhecida como paráfrase.
A paráfrase é um dos tipos de citações, também conhecida como citação direta. Outro tipo é a citação indireta em que são expostas as ideias de outro autor, mas sem usar as mesmas palavras empregadas por ele. Normalmente ao se fazer uma citação, seja direta ou indireta, deve-se colocar as informações de referência logo em seguida mediante o uso de parênteses apresentando o nome do autor e data. No caso específico da paráfrase é obrigatório acrescentar a página que se encontra a referencia.
Uma citação direta pode ser longa ou curta. Quando possui três linhas ou menos é considerada curta e deve vir entre aspas. Quando possui mais de três linhas é considerada longa e deve vir destacada do texto mediante o uso de recuo e de alguns recursos de diferenciação (tamanho da fonte, entrelinhas diferenciadas, família tipográfica etc.)
Existem diferentes normas para referência e citações, mas no Brasil a tendência é seguir o modelo estabelecido pela ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas). Para saber mais sobre eles, vale consultar os textos de Chibeni (s/d), Medeiros (2004) ou consultar as normas para dissertações e teses da PUC-Rio, que sintetizam parte dessas normas em seu modelo. Embora hajam diferentes formas de citação, vale destacar que a atribuição da fonte é um aspecto fundamental, pois do contrário corre-se o risco da apropriação indevida e se sofrer as sanções cabíveis aos casos de plágio.
Conclusão
Ao longo desse texto busquei expor algumas dos elementos esperados em textos acadêmicos. Conforme apresentado o texto dissertativo é um dentre os diversos tipos de textos acadêmicos e o mais comum e deve:
- Apresentar um juízo valorativo sobre um fato (o autor é a favor ou contra?)
- Possuir introdução, desenvolvimento e conclusão
- Mostrar clareza, objetividade, confiabilidade
- Ser original
- Identificar cuidadosamente as fontes de informação
A expectativas em relação ao texto acadêmico de natureza dissertativa condizem com os aspectos destacados acima e portanto a avaliação desses textos pressupõe que tais características sejam atendidas. Contudo, as práticas vigentes no meio digital tornaram comum as apropriações indevidas, sem a devida atribuição de autoria, configurando o plágio que, independentemente de ser intencional ou não, é quase sempre passível de sanções.
Vale ressaltar que não é ilícito utilizar referências e fontes de consultas em qualquer trabalho, afinal o conhecimento é construído de modo acumulativo e pressupõe a existência de conhecimentos anteriores, seja do pesquisador ou de outros. Porém, para que o uso das fontes ocorra de maneira lícita há uma série de estratégias que podem ser seguidas de maneira a caracterizar e identificar o uso das fontes tais como os diferentes tipos citações, a diferenciação da voz do autor de outras vozes e a listagem das referências.
Evidentemente, escrever um texto acadêmico é uma tarefa que não se resume aos aspectos listados aqui. Existem ocasiões, públicos, propósitos que diferenciam a maneira como o texto será elaborado. Além disso, há questões de estilo e formas de argumentação e formulação de pesquisa que dizem respeito à retórica e à metodologia de pesquisa. No entanto, aqueles são outros assuntos que escapam ao meu objetivo com o presente texto.
Referências:
CHIBENI, S. O Texto Acadêmico. Campinas: Unicamp. s/d. Disponível em [http://www.unicamp.br/~chibeni/textosdidaticos/textoacademico.pdf] acesso em 30/04/2012
FLICK, U. Introdução à pesquisa qualitativa. Trad. Joice Elias Costa. 3a ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.
MEDEIROS, J.B. Redação científica: a prática de fichamentos, resumos, resenhas. 6a ed. São Paulo: Atlas. 2004
PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro) Informe da Vice-Reitoria Acadêmica: Plágio e Direito do Autor no universo acadêmico. In: Rio de Janeiro: PUC-Rio s/d. Disponível em [http://www.puc-rio.br/noticias/nce_plagio.html] acesso em 30/04/2012.
UFF (Universidade Federal Fluminense), IACS – Instituto de Arte e Comunicação SOCIAL. Nem tudo que parece é: entenda o que é plágio. Niterói: UFF. s/d. Disponível em [http://www.noticias.uff.br/arquivos/cartilha-sobre-plagio-academico.pdf] acesso em 30/04/2012
Referência para esse texto:
CARVALHO, R. Sobre texto acadêmicos, plagio e referências. In Cultura Moderna e Contemporânea: blog de apoio à disciplina ART1420. Rio de Janeiro, 02 de maio de 2012. Disponível em [http://ricardoartur.com.br/cultura/2012/05/02/sobre-texto-academicos ] – (acrescentar a data de acesso)